Ultrasonagrafia

Introdução

A ultra-sonografia foi inicialmente desenvolvida no campo da medicina humana na década de 70 e passou a fazer parte dos meios de diagnósticos em medicina veterinária a partir dos anos 80 com a finalidade de diagnosticar a gestação em canídeos e felídeos. 

É um meio de diagnóstico não invasivo, baseado na captação dos ecos teciduais originados pela emissão de feixes ultra-sônicos e sendo assim não oferece riscos aos fetos ou a fêmea gestante. Atualmente, devido a ansiedade dos criadores em diagnosticar a presença da gestação, o exame ultra-sonográfico pré-natal tornou-se uma rotina constante nos centros veterinários de diagnóstico. Porém os benefícios do exame para os criadores vão além; pois permite planejar um manejo adequado durante a gestação, prever a data mais provável do parto e avaliar a viabilidade fetal. 

O exame ultra-sonográfico é um teste altamente preciso na avaliação da gestação, além de ser totalmente inócuo para a fêmea e para seus filhotes, pelo ultra-som pode-se confirmar a gestação, avaliar a idade gestacional, as condições dos ovários e do útero, as estruturas e condições vitais dos fetos e o desenvolvimento fetal através dos diferentes estágios gestacionais. 

Entretanto, através da ultra-sonografia não é possível dizer com precisão a quantidade de fetos presentes, apenas estimar o número de vesículas gestacionais visíveis em uma mesma imagem. Diagnóstico de gestação e desenvolvimento fetal O útero pode ser visualizado com o animal em decúbito dorsal, lateral ou em estação. Para sua avaliação, o exame deve ser executado na posição médio-ventral, lateral e caudal do abdome. Os aspectos lateral e caudal, minimiza a possibilidade de interpretações errôneas resultantes de artefatos gerados pela presença de gás no intestino. 

O estro na cadela tem início 1 ou 2 dias antes do pico de LH que tem duração aproximada de 5 a 9 dias. Após o pico de LH, a ovulação ocorre entre 24 e 72 horas e a fertilização entre 2 a 3 dias após a ovulação. Durante o período do estro, a cadela pode copular uma única vez ou várias vezes. A fertilidade do sêmen canino no trato genital feminino pode variar de 4 a 6 dias. Portanto, o tempo exato da concepção, e conseqüentemente a idade gestacional ou fetal, torna-se desconhecido. 

Para o diagnóstico positivo podem ser realizado uma palpação transabdominal entre 21º e 28º dias; exame radiográfico a partir do 49º dias após a última cópula e pelo ultra-som a partir do 20º dia na maioria dos cães e gatos. Estudos comparando estas três técnicas para o diagnóstico gestacional e estimação de número fetal, mostram que a radiografia apresenta 100% de precisão no diagnóstico positivo de prenhez no último trimestre da gestação e 93% de precisão na determinação número de fetos. O ultra-som tem 94% de precisão a partir do 30º dia após a cópula e a palpação era 88% preciso para diagnóstico gestacional. 

O estudo radiológico pode se tornar difícil de ser realizado em pacientes obesos ou que apresentem grande dilatação do abdome em virtude da gestação. A palpação retal tem sua limitação a cerca do porte do paciente e após 35 dias, a membrana fetal individual pode se tornar não palpável devido ao aumento generalizado do útero. A ultra-sonografia necessita de tricotomia abdominal ampla e um certo tempo de contenção o que pode ser desconfortável ou até estressante para a fêmea. O primeiro sinal ultra-sonográfico que confirma a gestação é a visualização da membrana fetal (também chamada de blastócisto, cavidade coriônica, vesícula embrionária) que pode ser observada 17 dias após o pico de LH. 

Esta membrana é simplesmente um blastócisto amadurecendo dentro do qual existe o embrião em desenvolvimento. As membranas fetais são visualizadas como pequenas estruturas esféricas, com vários milímetros em diâmetro (10mm), anecóicas rodeadas por um halo mais ecogênico, situadas dorsalmente à bexiga. Neste período tão curto de tempo deve-se atentar para a ocorrência de possíveis patologias como cistos no endométrio ou uma piometra em fase inicial, que poderão ser confundidas com a vesícula embrionária. 

Quanto mais precoce o diagnóstico, mais difícil, devido ao tamanho pequeno do útero e a membrana fetal pode ser muito pequena para ser identificada no exame inicial. Recomenda-se, para um diagnóstico preciso, que o ultra-som seja realizado, após 27 dias do pico de LH ou 25 dias depois da última cópula, isto significa que a gestação não pode estar a menos de 23–25 dias, desta forma é provável que a membrana fetal esteja com dimensões viáveis à avaliação, sendo provável que contenha um embrião detectável. Em cadelas da raça beagle foi visualizado a membrana gestacional dentro do corno uterino 20 dias após o LH ter surgido (18 dias depois da ovulação). O tecido uterino ao redor da membrana gestacional torna-se espesso e hiperecóico em relação ao tecido uterino adjacente. O embrião pode ser visualizado com 23 a 25 dias como uma estrutura oblonga ecogênica, localizado dentro da membrana fetal esférica, que aumenta rapidamente. Esta membrana é cercada por uma fina camada interna do útero de periferia hiperecóica que é o desenvolvimento placentário. 

A membrana fetal começa a mudar da forma esférica para oblonga a partir do dia 28. A placenta é reconhecida do dia 27 para dia 30 como uma estrutura focal cilíndrica, ficando evidente no 36º dia. O embrião distancia-se da parede uterina e se fixa pelo saco vitelínico a partir do 25º ao 28º dia. O saco vitelínico é visualizado como uma estrutura ecogênica linear, inicialmente em formato de "U", tornando-se uma estrutura tubular entre o 27º e o 31º dia; estende de pólo à pólo da membrana fetal do 31º para o 35º dia. A membrana alantoideana pode ser visualizada como uma estrutura fina, menos ecogênica que a membrana que cerca o embrião e saco vitelínico do 27º ao 31º dia. 

Os batimentos cardíacos fetais são primeiramente observados entre o 28º e 30º dia de gestação. A detecção dos batimentos cardíacos fetais pode, em alguns casos, ser observada entre o 23º e 25º dia após o pico de LH (19–25 dias após a primeira cópula), no mesmo dia ou um dia após a detecção do próprio embrião. O coração fetal é observado como um foco pequeno anecóico que tremula ecos rapidamente dentro do embrião e está cercado pelos pulmões que possuem aspecto isoecóico. Isto acontece antes das características anatômicas totais serem reconhecíveis. É observado movimento fetal a partir do 33º, 35º dia. 

Tanto a atividade cardíaca quanto o movimento fetal são achados que confirmam a viabilidade fetal. No momento da sua primeira detecção, a batida cardíaca varia entre 120 e 140 batimentos/minuto, 1 depois aumenta ficando em uma média, situada em aproximadamente 230 batimentos/minuto. Próximo ao parto (últimos 4 dias gestacionais) sofre uma redução que se torna significativa no dia do parto. Entretanto, batimentos abaixo de 140/minuto são registrados apenas nos casos de sofrimento fetal. A partir do 30º dia, a organogênese começa a ser identificada ultra-sonograficamente. Visualiza-se a cabeça e o corpo a partir do dia 28. Na parte interna do crânio visualiza-se um foco inicialmente anecóico (plexo coróide) que gradativamente torna-se ecogênico, cercado pelo ventrículo cerebral anecóico. A medida que o feto aumenta, o esqueleto pode ser identificado como estruturas hiperecóicas formando sombras acústicas. O fêmur é reconhecido a partir do 35º dia. 

O esqueleto fetal pode ser identificado a partir do 33º, 39º dia e é visto como estruturas hiperecóicas formadoras de sombra acústica. A cabeça é visualizada primeiro, seguido pela mineralização rápida da espinha torácica e costelas, espinha cervical e esqueleto apendicular. A vesícula urinária e estômago são os primeiros órgãos abdominais a serem identificados sonograficamente a partir do 35º–39º dia e aparecem como um foco circunscrito de área anecóica. O estômago e a vesícula urinária enchem e esvaziam durante um período de tempo, podendo ser observados vários graus de distensão que podem mudar durante o curso do exame. 

A ecogenicidade do pulmão pode variar durante desenvolvimento sendo relativamente isoecóica a do fígado quando vistos inicialmente, o que não proporciona uma definição clara entre eles. A orientação é feita pelo posicionamento do coração, estômago e vesícula urinária. Os pulmões se tornam hiperecóicos em relação ao fígado quando o feto se desenvolve do 38º ao 42º dia. Os rins e os olhos são visualizados entre o 39º e o 47º dia. Os rins são hipoecóicos com pelve proeminente e anecóica. Com o tempo, podem ser diferenciadas a córtex e a medular renal e a pelve se torna menos dilatada. 

O coração tem ecogenicidade variando de hipoecóico à anecóico, com ecos dos septos lineares que representam as paredes da câmara e válvulas do coração. As quatro câmaras do coração são vistas a partir do 40º dia e os grandes vasos cardíacos podem ser visualizados alguns dias após. A partir do 57º ao 63º dia ocorre a diferenciação das alças intestinais e o peristaltismo se torna visível. Número de fetos A contagem fetal tem sido mencionada como sendo de pouca acuidade e conduzindo a um acréscimo significativo do tempo de exame. 

A estimação do número de fetos pode ser realizada entre o 27º e o 37º dia após o pico de LH, quando esta é mais precisa. Antes deste tempo, o tamanho da ninhada pode ser subestimado, porque a membrana gestacional é pequena e algumas podem estar indeterminadas. Depois desta data, a contagem dos fetos é menos precisa, porque com progresso da gestação os fetos ficam confluentes estando rodeados pelo fluído fetal e o comprimento fetal normalmente fica maior que a largura da imagem sonográfica o que torna muito difícil de distinguir os cornos uterinos, além de sua dilatação, sendo assim, o mesmo feto pode ser contado mais de uma vez. 

A precisão da contagem tende a diminuir com o aumento da dimensão da ninhada. Em ninhadas grandes há normalmente uma subestimativa, por possibilidade de existir um feto oculto por alças intestinais ou pelos arcos costais. A sobreestimativa fetal pode resultar da contagem de um feto duas vezes ou por reabsorção embrionária. A maioria dos autores sugere que o número fetal não pode ser julgado com precisão utilizando a avaliação ultra-sonográfica. 

A determinação absoluta e precisa do número fetal incerta, especialmente no início e final da gestação. O problema está no fato que somente pequenas porções da área reprodutiva podem ser visualizadas, podendo ser contados fetos mais de uma vez ou não. Apesar de não poder obter o número exato de fetos, na prática é possível ter uma estimativa. Em um estudo realizado em 66 cadelas, a contagem exata do número de fetos foi possível em apenas 31,8% das ninhadas. Em outro, para as ninhadas com 0–3 crias a contagem precisa foi de 100%, enquanto que em ninhadas com 4–8 fetos foi possível uma acuidade de 75,3%. A dimensão limite da ninhada para uma contagem fetal rigorosa é referida como sendo 4 ou 5 fetos. Uma a duas semanas antes do parto a redução do líquido amniótico e a progressiva calcificação óssea do feto, especialmente do crânio, da coluna vertebral e das costelas, produzem ecos de intensa reflexão com produção de sombra acústica, que compromete a visualização. Nesse estágio, e especialmente nas ninhadas maiores, fica praticamente impossível efetuar a contagem do número dos fetos, pois pode ocorrer a não visualização do feto, a dupla contagem, a superposição, a presença de sombra acústica. 

Medidas fetais e idade gestacional A determinação da idade do feto é sempre uma questão freqüente durante o exame ultra-sonográfico. Em veterinária, a utilização da biometria fetal é ainda efetuada de maneira restrita, considerando-se que não existem tabelas adequadas às diferentes raças caninas. Devido à variabilidade entre as raças, a determinação da idade gestacional aproximada pode ser realizada com base na identificação das diferentes estruturas fetais que tem como aplicação prática a previsão da data do parto. Embora a organogênese siga um padrão comum nas diferentes raças caninas, existem consideráveis diferenças nas dimensões fetais no termo da gestação. A estimativa baseada na idade gestacional provavelmente é menos precisa para em cadelas de raças miniaturas e gigante que contêm um ou dois fetos durante a gestação, sendo que provavelmente, seja mais precisa durante o segundo trimestre.

O segundo trimestre também é o momento que as mudanças mais óbvias em anatomia fetal acontecem. A mensuração ultra-sonográfica e a escolha do parâmetro depende do estado da gestação, pois o crescimento fetal não se processa uniformemente para todos os parâmetros. No entanto, a determinação do diâmetro de algumas estruturas são usualmente utilizadas e oferecem uma idéia bastante aproximada da idade gestacional como é o caso da vesícula embrionária, que pode ser visualizada precocemente aos 18–20 dias pós-ovulação; o diâmetro biparietal longitudinal do crânio entre o 36º e o 58º dia pós-ovulação; ou ainda o diâmetro transversal do tronco ao nível do estômago entre 22º e 58º dia pós-ovulação. 

Anormalidades na gestação Com o uso da ultra-sonografia pode-se descobrir uma variedade de condições que podem acontecer durante uma gestação anormal, como a reabsorção fetal, aborto, desenvolvimento embrionário atrasado, morte fetal antes ou durante o parto, sofrimento fetal, e uma variedade de outras condições. Uma redução dos batimentos cardíacos fetais para menos de duas vezes que o materno e redução do movimento fetal são indicativos de sofrimento fetal. Quando a taxa de coração fetal aumenta em resposta à tensão é um sinal positivo, indicando vigor fetal. 

O reconhecimento de morte fetal próximo ao parto é de extrema importância, sendo caracterizada por perda de atividade cardíaca. Deve-se, também, ser analisado a motilidade fetal, deglutição e movimentos dos membro. O reconhecimento estruturas ultra-sonográfico das fetais diminui rapidamente depois da morte. Depois de um dia ou dois, apenas as estruturas esqueléticas mineralizadas podem ser reconhecidas por hiperecogenicidade característica e sombra acústica. Também é encontrado gás no interior do útero ou no feto seis horas após o óbito. 

Se a morte embrionária ocorrer antes de 25 dias após a ovulação, resulta em maceração e reabsorção completa do embrião. A reabsorção é reconhecida pela redução em tamanho do embrião, mudança em fluído embrionário de anecóico para hipoecóico com presença de partículas ecogênicas em suspensão e a cessação de batimentos cardíacos. A membrana gestacional se desprende, e a parede uterina adjacente pode estar relativamente hipoecóica. Estas mudanças acontecem rapidamente, dentro de horas e aumentam com o passar dos dias. A morte fetal após 35 dias de gestação resulta, geralmente, em aborto, mas nem sempre afetando toda a ninhada. Fetos mortos perdem a visualização sonográfica normal rapidamente e são expelidos em poucos dias. A morte fetal é mais comum durante a primeira metade da gestação e nesta fase, é comum observar um ou dois locais de reabsorção fetal. Estudos ultra-sonográficos sugerem que a incidência de reabsorção fetal espontânea varie de 5% a 13% em gestações caninas antes do 40º dia de gestação. 30